#17
Deixa-me ser Olivia nos teus braços.
"Promessas? Foram as promessas de um miúdo de dezassete anos, apaixonado! Dezassete anos, caramba. De que estavas à espera? Somos tão idiotas com essa idade, fazemos tanta merda... Mudamos tanto, somos tão incrivelmente voláteis. Como é que acreditaste nesses sentimentos com tanta convicção, ao ponto de te magoar assim? Claro que não era ele quem ia ficar, ele ainda tem demasiado para ver e fazer até descobrir que cometeu o maior erro da vida dele. Não deixes que isso te destrua, a culpa não é tua. Já sofreste o suficiente, Olivia! Vai ficar tudo bem."
Hoje não estudei, após semanas imensamente capaz. Mais uma frequência pelo caralho. Hoje não chorei, porque esvaziei o peito e esgotei as lágrimas durante a noite. Hoje não dormi. Hoje aprendi que nunca ninguém fará de mim prioridade e que está na altura de deixar de o fazer também. Hoje decidi não mendigar atenção, nem forçar a passagem dos monólogos a diálogos.
Tudo isto quando finalmente volto a mim, quando deixo de ser um fantasma, quando torno o passado cicatriz e não âncora. Digam-me, alguém que me diga por favor, porque insistem eles em iludir-me? Porque insistem eles em dizer-me que tudo será diferente? Porque é que me fazem amá-los, quando são os primeiros a fugir quando derrubo todos os meus medos e os amo de volta? Digam-me: ninguém merece, pois não?
As páginas em branco não me têm atormentado, porque deixei de ter a coragem necessária para as enfrentar; estão ali, à distância de dois cliques, esquecidas. O som irritante do teclado, abafado por Blue October ou a banda sonora de um filme qualquer, já não faz parte dos meus serões - para além das pontuais conversas na rede social que tomou conta das nossas vidas. Substitui o chá pelo café e isso tornou-se uma característica. Não leio "há mais de uma semana" fazem várias semanas e, mesmo assim, consigo adormecer sem procurar essa companhia. Não tenho sentido necessidade de estar sempre a fazer alguma coisa, como a Olivia que fui sentiu; entrar no quarto, depois de um dia cansativo (ou mesmo depois de um dia mais relaxado), sentar-me na cama e ficar a olhar pela janela, sem grande foco, é, agora, perfeitamente aceitável. Caramba!, até ficar a olhar para as paredes é aceitável. Estou diferente, sinto-o mais do que nunca. Ainda não o digeri como deve ser, nem tenciono fazê-lo tão cedo. Porque, por agora, é suficiente. Apercebi-me que consigo ser feliz quando não me concentro em nada em específico, quando não penso no próximo evento, no próximo mês ou no próximo verão e naquilo que tenciono ou não fazer deles, quando me entrego ao momento, à satisfação das vontades do agora, quando não penso em demasia, quando me deixo ir. Sabe bem deixar-me ir e assim vou.
Talvez esperassem que o tivesse assimilado. Afinal, "ninguém" no seu perfeito juízo cai, por duas vezes, na mesma asneira. O ciclo repete-se; tenho tendência para isto. Mais uma vez o coração em alvoroço, pequenino, pequenino e a querer ser tão grande. Porque pedem eles Amor, porque demandam que os ame, que os adore, que faça deles mundo? Quando, no exacto momento em que tal se torna uma realidade, me derrubam da inebriação? Vou a medo, tenho receio... Abro as asas, bato-as duas vezes e é vê-los a serem os primeiros com as pedras na mão.
Acho que nem imagina, que nem se apercebe, que nunca terá noção. Talvez não signifique o que, para mim, se apresenta como tão claro. Mas, se, inacreditavelmente, assim for...
Sim, o tempo ajuda. O tempo passa e vou vencendo as estações, os meses, as semanas, os dias e os diferentes momentos destes. Tinham razão, sobrevivi. Estou aqui - voltei a estudar, a rir com vontade, a conviver com outras pessoas, a fazer refeições decentes e ele deixou de me aparecer tão frequentemente em sonhos. Sobrevivi... O que não significa que esteja a viver. Tudo se torna um bocadinho impossível quando ainda procuro o cheiro, o abraço e a voz para me afagarem ao final do dia.
O corpo rejubila na plenitude de um encontro marcado a ferros por todo ele. A mente, que nem uma criança, deseja seguir-lhe os passos, pese embora avance tímida, ainda receosa - a realidade teima em infiltrar-se, a persistir no seu aprisionamento. Quando o corpo distrai a mente o suficiente, esta acompanha-o no compasso desenfreado do momento - a sentir tudo, a querer tudo, a prometer tudo e a ser, apenas e só! E hoje a mente foi tudo; não deixou o corpo sozinho na sua euforia.
Acordo a arfar, desorientada. Sinto um aperto no estômago e um nó na garganta. As lágrimas inundam-me o rosto, acompanhadas por gemidos que doem no peito. O telemóvel começa a tocar, a meu lado. O nome aparece desfocado - as lágrimas toldam-me a visão. Finjo não ouvir, viro-me para o outro lado e mergulho, de vez, no que dói, no choro e no sonho que ainda não me deixou.